O poder do feedback por Lena Ferreira

Lena Ferreira por Bernardo Oliveira
Imagine que todo mundo passasse a entender tudinho o que você diz do jeitinho que você quis dizer. E a recíproca também fosse verdadeira; quando o outro falasse você não tivesse dúvidas sobre qual o real sentido e a verdadeira intenção por detrás de suas palavras. Bom demais, não é?
Quando eu era profissional de gestão de projetos, entrei em contato com uma estatística estarrecedora: “Mais de 80% dos problemas nos projetos, nas empresas, nos relacionamentos profissionais têm na sua base problemas de comunicação”. É muito!
Em uma comunidade em que moramos, trabalhamos e desenvolvemos nosso propósito de vida não podemos correr esse risco. Por isso, as comunidades do mundo inteiro foram desenvolvendo ou adotando ferramentas em busca de um mais perfeito entendimento entre as pessoas. Uma das principais é o feedback.

Há ecovilas, como a Vila Yamaguishi em Jaguariúna (SP) em que as reuniões gerais são diárias e sempre incluem algum tipo de feedback. Há até uma brincadeira entre as ecovilas de que “quem não gosta de discutir a relação não vá para a Yamaguishi”. Eles se riem dessa afirmação e retrucam que a melhor hora do dia, a mais esperada de todas, é a hora da reunião. E deve ser boa mesmo porque eles vivem de forma muito harmoniosa. Todos os anos oferecem a vivência de TOKOU onde passam suas tecnologias de relacionamento.

Há vários níveis de feedback. Há os bem simples como, no meio de uma reunião, para medir a temperatura emocional do grupo pedir para colocarem os polegares para cima (está ótimo ou concordo), para baixo (não estou gostando ou não concordo) ou para o lado (está mais ou menos ou sou neutro). Gráficos compostos coletivamente também são bem eficientes (onde cada um vai posicionando uma estrelinha ou bolinha dentro de uma escala) ou targetas com respostas coladas abaixo de perguntas como “Que bom”, “que pena”, “que tal?”

Mas há níveis mais profundos que requerem muita habilidade de relacionamento.  Por exemplo, durante a realização de uma seção de feedback sobre comportamentos indesejáveis ou qualquer aspecto sombrio de uma determinada pessoa é necessário por parte de quem recebe abrir o coração, ouvir até o fim sem interromper, aceitar a opinião do outro mesmo que seja diferente da sua, agradecer a transparência, e ficar um tempo em silêncio para assimilar o que foi dito. Por outro lado, terá a garantia, por parte de quem dá o feedback, de se cumprirem os acordos de respeito, cuidado, confidencialidade e a fala sempre em primeira pessoa, sem acusações ou julgamentos. Para que melhor funcione, além do feedback a comunidade geralmente é iniciada em outra ferramenta muito poderosa que é a Comunicação não-Violenta, da qual trataremos em outro texto.

Para um feedback ter resultado e ser preventivo de conflitos devemos nos certificar de que o receptor está disponível e aberto para recebê-lo naquela hora e local. Se a pessoa não estiver propensa a ouvir com atenção não adianta falar. É melhor tentar marcar outra hora e local ou esperar pelo momento mais propício. Se a pessoa estiver muito resistente, pode-se pedir a ajuda de alguém que ela considere para que a estimule a ouvir o feedback. As duas partes têm que reconhecer que ninguém é dono da verdade. Pelo contrário, cada um possui só o pedaço da verdade até onde pode alcançar o seu ponto de vista.

Pode ser muito difícil receber um feedback. Mesmo quando este é dado com todo o respeito e compaixão pode esbarrar em limitações emocionais ou dificuldades que têm causas subconscientes a que não temos acesso. Por isso é necessário muito amor, empatia e compreensão por uma possível dificuldade de quem recebe em ouvir. E quem dá o feedback precisa de habilidade, equilíbrio emocional e um cuidado muito grande para que a situação (“o campo”) esteja sempre favorável para as pessoas poderem se expressar verdadeiramente. Falas com carga emocional ou generalizantes (ex: Todo mundo acha a mesma coisa) bloqueiam a comunicação, assim como se utilizar de fatos ou informações do passado e isso atrapalha o feedback.

Mas para além desses feedbacks difíceis mas necessários, que abordam conflitos, também há os feedbacks positivos, felizes, celebrativos que, obviamente, são mais fáceis de dar e receber. Não se deve perder a oportunidade de dizer o quanto apreciou o produto do outro (a palestra, o bolo, o comportamento etc). É um estímulo para a pessoa fazer de novo além de deixá-la feliz. O que a gente reforça se repete, por isso é importante elogiar. A comunidade também ficam mais feliz quando todos expressam sua apreciação positiva uns sobre os outros.

Há algumas orientações que podem nos ajudar a construir bem nossos feedbacks. Se é um feedback difícil é bom elaborar sua fala antes, mesmo ensaiá-la para que haja foco, concisão e clareza na hora de falar. Mas mesmo que seja um feedback positivo e feliz, para ele ser bom, a deusa CERES pode nos ajudar a lembrar das principais qualidades desejáveis:

C – clareza –  Deve partir de uma observação palpável, não de uma vaga opinião;
E – equilibrado – não expressar emoções ou julgamentos de quem o dá;
R– regular – não esperar se repetir várias vezes nem deixar passar muito tempo antes de falar;
E – específico – sobre um fato ou comportamento verificado e não sobre uma impressão geral sobre a pessoa;
S – seu – é a posição de quem está falando, não inclui o que os outros acham.

As pessoas se sentem mais seguras e convivem com mais confiança quando a comunidade pratica o feedback. Ele ajuda a harmonizar os relacionamentos e abre caminho para o crescimento no convívio com os outros. Fiquem à vontade se quiserem enviar feedbacks sobre este Blog. Eu adoraria!

Lena Ferreira
Designer em Sustentabilidade
Pedagoga Social e da Cooperação
Consultora de Relações Humanas da Amainar

Texto protegido pela Lei de Direito Autoral nº 9610/98


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